DO RECONHECIMENTO E EXECUÇAO DA SENTENÇA ARBITRAL
DO RECONHECIMENTO E EXECUÇAO DA SENTENÇA ARBITRAL
Silvia Fazzinga Oporto
SUMARIO: INTRODUÇÃO - SENTENÇA - 2.1. SENTENÇA NA JUSTIÇA ESTATAL -2.1.1. REQUISITOS SENTENÇA ARBITRAL - 2.2.1. REQUISITOS - CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 9.307/96 - 3.1. HOMOLOGAÇÃO DA SENTENÇA ARBITRAL - NATUREZA GLOBAL DA ARBITRAGEM - A ARBITRAGEM ENTRE OS PAÍSES DO MERCOSUL - RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DA SENTENÇA ARBITRAL - CONCLUSÃO ANEXO II – Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal -REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .
Resumo
Atualmente, o Judiciário se apresenta extremamente sobrecarregado em suas funções. A demora na resolução dos processos, o custo excessivo, a baixa qualidade das sentenças, entre outras causas, fazem com que cada vez seja maior o descrédito das instituições judiciárias. Essa situação, motivou a busca de mecanismos mais rápidos e eficientes para atender e otimizar a prestação jurisdicional.
Os meios alternativos para soluções de conflitos surgem, não para se confrontar com o Sistema Judiciário atual, senão apenas auxiliar e, por que não dizer, completar esse sistema.
Por essa razão, foi necessário fornecer ao setor privado as bases legais para que a conciliação, a mediação e a arbitragem possam ser utilizadas, produzindo a regulamentação da matéria, haja vista que o futuro desses institutos está diretamente relacionado com um sistema justo, célere, eficaz e legítimo de solução de controvérsias.
Institui-se, então, a arbitragem como um sistema alternativo para solução de controvérsias que discutam direitos patrimoniais disponíveis.
Apresentam-se aqui a importância das formalidades do procedimento arbitral, e consequentemente da sentença proferida, seus requisitos, a necessidade de serem respeitadas as formalidades previstas em lei para a validade tanto da Cláusula como do Compromisso Arbitral, evitando assim possíveis nulidades e vícios nas sentenças e, ao final, o Reconhecimento da mesma e a legitimação alcançada pelo instrumento, quando julgada constitucional a Lei 9.307/96, pelo Supremo Tribunal Federal, na qual se reconhece a arbitragem como meio democrático de solução de conflitos, respaldada pelo princípio da autonomia da vontade (pacta sunt servanda) e se dispensa a obrigatoriedade da homologação de laudos proferidos pelo Judiciário Estatal estrangeiro para torná-los válidos no território brasileiro.
Trata-se, também, não apenas do reconhecimento da Sentença Estatal, mas também da Sentença Arbitral, resultado do instituto no âmbito internacional e, mais restritamente, do Mercosul, onde há um enorme incremento nas relações comerciais regionais, o que determina a procura de instrumentos para soluções de controvérsias compatíveis com a velocidade das transações comerciais internacionais.
A arbitragem comercial é, sem dúvida, uma alternativa muito viável para solução rápida e econômica de controvérsias entre particulares e, ainda mais, se estes são de países distintos. Será destacada a importância dos Tratados e Protocolos que encaminharam a inclusão da arbitragem como recurso jurídico internacional e sua conseqüente aplicação nas relações comerciais e nos conflitos e litígios que delas se originam.
Concluindo, verifica-se que para que a sentença arbitral seja eficaz, é indispensável que sejam cumpridas as formalidades do procedimento, o que resultará na possibilidade de execução da mesma.
Assim, pretende-se neste trabalho demonstrar que essas inovações fazem da arbitragem uma alternativa legítima e eficaz para solucionar disputas, sejam elas nacionais ou envolvam interesses internacionais.
Introdução
A demora na resolução dos casos, o custo excessivo, a baixa qualidade das sentenças, entre outras causas, fazem com que cada vez seja maior o descrédito das instituições judiciárias. Não há aqui o objetivo de propor que o Poder Judiciário seja alterado, mas sim de apresentar a arbitragem como um dos meios de solução de controvérsias, em determinadas áreas, em que se discutam direitos patrimoniais disponíveis, não se confrontando com o sistema Judiciário atual, senão apenas auxiliando e, por que não dizer, completando esse sistema.
Recentemente tivemos a legitimação deste procedimento, quando o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a Lei n.º 9.307/1996, que dispõe sobre procedimentos arbitrais. Foi reconhecido que a arbitragem é um meio democrático de solução de conflitos, respaldado pelo princípio da autonomia da vontade, a chamada “pacta sunt servanda”, onde a via arbitral somente é adotada se as partes assim o quiserem.
Se a nova lei brasileira foi um grande avanço no país, que favorece inclusive a harmonização legislativa no Mercosul, deve-se considerar que ainda restam algumas modificações em prol de uma maior modernidade do instituto.
A arbitragem comercial é, sem dúvida, uma alternativa muito viável para solução rápida e econômica de controvérsias entre particulares, e ainda mais, se estes são de países distintos.
Porém, a adoção desse instituto no Mercosul merece uma atenção redobrada, tendo em vista as dificuldades econômicas, políticas e sociais que os Estados membros enfrentam no atual momento, em que, ainda que funcionando a Comunidade Européia, Mercosul e outros, muitas vezes é questionada a eficácia dos blocos comerciais.
Por essa razão, é necessário fornecer ao setor privado as bases legais para que a conciliação e a arbitragem possam ser utilizadas, produzindo a regulamentação da matéria, haja vista que o futuro dos acordos de integração econômica está diretamente relacionado com um sistema justo, célere, eficaz e legítimo de solução de controvérsias.
Por outro lado, se existe esse problema no Judiciário, e que não é prerrogativa apenas de nosso país, observa-se que no âmbito do Mercosul há um enorme incremento nas relações comerciais regionais onde empresas, produtores e comerciantes encontraram novas formas de negociação e possibilidades de comercialização de seus produtos, as quais necessitam de instrumentos de soluções de controvérsias compatíveis com a velocidade das transações comerciais internacionais.
O desenvolvimento do comércio internacional é fator importante que caracteriza a atual realidade mundial. A formação da OMC (Organização Mundial do Comércio) e o surgimento dos diversos processos de integração entre os países, como a União Européia e os Blocos Comerciais como NAFTA e o Mercosul são manifestações da realidade que rege este mercado.
Nas relações de comércio internacional, a arbitragem é prática comum e pode resolver questões complexas de direito com maior agilidade que o Judiciário, escolhendo árbitros independentes e imparciais que podem ser especialistas na matéria e resolver a controvérsia em sigilo, já que a arbitragem está livre da publicidade dos processos judiciais.
Nos últimos anos a arbitragem no Mercosul vem apresentando grande progresso, contribuindo para o fortalecimento deste Bloco Comercial, e proporcionando um novo meio de solução de conflitos. Entretanto, há diversas providências que precisam ser tomadas para que a arbitragem seja mais conhecida e empregada, e que haja uma maior confiança quanto ao seu procedimento.
No Mercosul já foram estabelecidos instrumentos jurídicos visando a criação de meios alternativos de soluções de controvérsias privadas, disciplinando questões importantes para a uniformização normativa que facilita a administração da justiça, podendo ser citados, entre outros, o Protocolo de Las Leñas de 1992, o Protocolo de Ouro Preto de 1994, o Protocolo de Buenos Aires de 1994 e o Protocolo de Olivos firmado em 18 de fevereiro de 2.002.
As diferentes legislações, as diversas formas de interpretação da lei, a diversidade de formação dos profissionais fazem com que a arbitragem se torne um caminho interessante, visto que, como um meio idôneo para solucionar conflitos, pode ser utilizado na hora da elaboração de contratos em que estejam envolvidas pessoas de diferentes nacionalidades e domicílios, ou em que a execução do contrato envolva diversas legislações e foros.
De igual importância, para que os procedimentos arbitrais ultrapassem as fronteiras de diferentes países, é imprescindível que as sentenças e laudos arbitrais sejam reconhecidas sem a necessidade de homologação, atingindo assim resultado célere e eficaz ao litígio.
Os quatro países coincidem em relação às matérias arbitráveis, estas patrimoniais suscetíveis de transação; quanto às pessoas que podem submeter suas pendências à arbitragem, em relação à capacidade e objeto da controvérsia; quanto ao laudo arbitral, onde este deve ser motivado e redigido como se fosse uma sentença; quanto à execução dos laudos arbitrais nacionais, os quais tem força executória perante a Justiça togada.
2. Sentença
Para o correto entendimento do estudo desta matéria, parece ser fundamental que se entenda o significado literal da palavra e, posteriormente, os desdobramentos do assunto quando aplicado, não apenas no âmbito estatal mas também na solução do procedimento arbitral entre particulares.
SENTENÇA:Do latim sententia(modo de ver, parecer, decisão), a rigor da técnica jurídica, e em amplo conceito,sentença designa decisão, a resolução, ou a solução dada por uma autoridade a toda e qualquer questão submetida à sua jurisdição.[1].
2.1. Sentença na Judicial Estatal
No campo do direito processual civil, prevalecem os entendimentos de ser a sentença, a declaração concreta da lei, por intermédio do Estado, para solucionar litígios, correspondendo ao direito subjetivo que as partes têm, de recorrer à prestação jurisdicional. Logo, pela sentença o Estado cumpre seu dever.
Por definição de Pontes de Miranda, a sentença “é emitida como prestação do Estado, em virtude da obrigação assumida na relação jurídica processual (processo), quando a parte ou as partes vierem a juízo, isto é, exercerem a pretensão à tutela jurídica” [2].
Pela sentença o Juiz põe termo ao processo, porém, não sendo preenchidos os requisitos legais, esta poderá ser terminativa, sem que o mérito seja resolvido; já as sentenças definitivas, decidem o mérito da causa, total ou parcialmente.
De fato, apresenta-se aqui uma das grandes diferenças entre o processo tutelado pelo Estado e o processo de arbitragem posto que, o que se procura no procedimento arbitral é a celeridade e a eficácia da decisão, sem burocracia, de modo que a sentença seja definitiva.
2.1.1. Requisitos
O Código de Processo Civil dispõe nitidamente que a sentença deverá ser clara e precisa, e apresentará o relatório contendo o nome das partes, o pedido a defesa e o resumo dos respectivos fatos; os fundamentos de fato e de direito e a decisão.
Nesse sentido, a Constituição Federal, no artigo 93, determina serem imprescindíveis esses três itens, sob pena de nulidade. Podem, então, ser consideradas nulas as sentenças proferidas “com abstração ou omissão de ponto relevante da defesa; sem motivação; sem fundamentação; em que se deixou de lançar o indispensável relatório”[3]; enfim, a sentença deve preencher todos os requisitos previstos no artigo 485 do Código de Processo Civil e seus fundamentos, além de consubstanciar a discussão analítica dos fatos e o direito aplicável.
2.2. Sentença Arbitral
De igual forma à do procedimento estatal, a sentença arbitral põe fim ao processo, devendo ser sempre apresentada de forma escrita, nos termos do art. 24, “caput” da Lei 9.307/96, e também, como a sentença judicial proferida pelo representante do Estado, deve conter relatório, fundamentação e dispositivo. Ainda, obrigatoriamente, incluirá também, o local e a data de onde foi proferida.
O prazo para o árbitro sentenciar é de seis meses a contar da data da instituição da arbitragem, salvo se houver disposição contrária pelas partes.
Os critérios de julgamento adotados pelo árbitro, para emitir seu posicionamento a respeito do conflito, podem ser de direito ou por equidade. Sendo que a primeira se vale do direito positivo, quer dizer, das normas escritas no sistema jurídico; diferente da equidade, pois esta se utiliza de critérios de igualdade, de justiça e no respeito ao direito alheio.
Há, por outro lado, outro momento em que o Judiciário poderá intervir no procedimento arbitral. Ainda que a decisão arbitral encerre a atividade dos árbitros e ponha fim ao compromisso, a sentença arbitral é passível de recurso. Assim explica o professor Silvio Salvo Venosa: “Nada impede, e seria até possível, que as partes autorizem o recurso a um outro Tribunal Arbitral ou a uma outra forma de Tribunal Arbitral. Nada impede também que o regulamento interno do Tribunal Arbitral preveja recurso. No momento, não é o que ocorre e nem o que deve ocorrer.” [4]
2.2.1. Requisitos
Os requisitos que, necessariamente, devem conter as sentenças arbitrais são aqueles expressos no Capítulo V da Lei 9.307, de 23 de setembro de 1996, quais sejam:
Art. 26° São requisitos obrigatórios da sentença arbitral:
I - o relatório, que conterá os nomes das partes e resumo do litígio;
II - os fundamentos da decisão, onde serão analisadas as questões de fato e de direito, mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por equidade;
III - o dispositivo, em que os árbitros resolverão as questões que Ihes forem submetidas e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e
IV- a data e o lugar em que foi proferida.
Parágrafo Único. A sentença arbitral será assinada pelo árbitro ou por todos os árbitros. Caberá ao presidente do tribunal arbitral, na hipótese de um ou alguns dos árbitros não poder ou não querer assinar a sentença, certificar tal fato.
O artigo 31 da mesma lei expressa que “a sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelo órgão do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo”.
A sentença arbitral será proferida por um ou mais árbitros, expressa em documento escrito conforme o artigo 24°, no prazo estipulado pelas partes. Nada tendo sido convencionado, o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses, contando da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro. Art. 23°.
3. Constitucionalidade da Lei 9.307/96
Muito se questionava sobre a constitucionalidade da lei 9.307 desde que sancionada em 1996. Discutia-se o posicionamento de alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal quanto à constitucionalidade do procedimento arbitral, a preocupação com a demora da decisão sobre esse instituto e, conseqüentemente, a falta de uniformidade legislativa.
Nesse aspecto há uma fundamental diferença desde maio de 2002, em que o Supremo Tribunal Federal votou como constitucional a utilização de meios alternativos para solução de conflitos, mais propriamente a arbitragem. Antes desse julgado, existia dificuldade na aplicação da arbitragem no Brasil, porque a matéria da cláusula arbitral permanecia sob o crivo do Tribunal. O resultado é a valoração do momento em que é assumido o compromisso, possibilitando que, no eventual impasse, seja instaurada a arbitragem compulsoriamente.
Os pontos polêmicos até hoje considerados e discutidos pelo STF são a compatibilidade da execução específica da obrigação assumida pela cláusula compromissória e o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, constitucionalmente garantido; por outro lado, a análise acerca da violação do princípio do duplo grau de jurisdição decorrente da arbitragem, já que, pela livre vontade das partes, podem elas de antemão prever que a decisão sobre seu litígio será irrecorrível. Conseqüentemente analisa-se a importância destes precedentes para a utilização da arbitragem no Brasil.
No que tange à homologação de laudo arbitral estrangeiro, bastava a homologação pelo STF para que tal laudo produzisse efeitos no Brasil, não mais se fazendo necessária a exigência da chamada dupla homologação. Esta inovação da Lei já foi acatada pelo STF, que não levanta dúvidas relativas a sua constitucionalidade.
Sobre a inafastabilidade do Poder Judiciário, o jurista Welber Barral afirma que “a Lei de Arbitragem não admite o arrependimento unilateral, proibindo que uma parte, tendo de antemão previsto a utilização da arbitragem, recorra ao Judiciário para solucionar seu litígio, desconsiderando a outra parte que desejasse resolver o conflito pela arbitragem” [5].
É preciso ressaltar que ninguém é obrigado a adotar como base contratual a arbitragem porém, conforme determina a Lei 9.307/96, tendo sido adotada a arbitragem pelas partes, uma delas não pode, isoladamente, negar-se a resolver a pretensão pelo instituto; não é possível o arrependimento unilateral.
A inconstitucionalidade desta Lei se fundamenta no artigo 5o, inciso XXXV da Constituição Federal, que dispõe que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça de lesão a direito. Por outro lado, aqueles que discordam, se sustentam no argumento de que não é a Lei que obriga as partes a se afastarem do Judiciário; isto ocorre por vontade autêntica das próprias partes, o que a Constituição não veda. “A Constituição não obriga a que as partes levem sempre ao Judiciário toda a demanda que tiverem, podendo estas, per se, resolver seus conflitos” [6], lembra Barral.
Não se deve admitir o arrependimento unilateral, desprestigiando a obrigação assumida na cláusula arbitral. O compromisso assumido pela autonomia plena da vontade, é exatamente o motivo que permite que se afaste a jurisdição estatal. É oportuno ressaltar que, deve-se ter em conta a interferência do Judiciário que, na hipótese de uma parte se arrepender, contratar a arbitragem na cláusula compromissória, ou mesmo no compromisso arbitral contratual e depois se recusar a se submeter a ela, que a arbitragem seja imposta judicialmente.
Desta forma, quando forem iniciados os trabalhos de instauração do juízo arbitral, e uma parte se recusar a fazê-lo, é viável o ingresso unilateral em ação judicial diretamente no Tribunal Estatal; esse dispositivo da lei permite que a outra parte ingresse, também, com uma ação judicial, para que o Juiz determine pela instauração do juízo arbitral.
Outro aspecto que vem sendo discutido é o da violação do princípio do duplo grau de jurisdição. O entendimento pacífico a esse respeito é de que, mediante prévia manifestação de vontade das partes, afasta-se a jurisdição estatal, estabelecendo que terceiros, com conhecimentos especializados sobre a matéria discutida, resolvam seus conflitos de forma mais eficaz.
Cite-se a propósito, novamente utilizando os conhecimentos de Welber Barral e Tatiana Prazeres, que “Apesar de algumas decisões discrepantes sobre este ponto, também não parece restar dúvida. A Lei de Arbitragem não fere o princípio do duplo grau de jurisdição, pois que este princípio é válido no âmbito do Poder Judiciário, nada impedindo que as partes, ao definirem a fórmula de resolução do seu conflito, afastem tal possibilidade. A inocorrência de violação ao duplo grau de jurisdição é confirmada pelo próprio Ministro Pertence” [7].
Vale a pena aqui apresentar o mesmo exemplo que vários juristas, Welber Barral e Tatiana Prazeres entre outros, vêm utilizando, qual seja, o Caso MBV x Resil em que se produziu vasta discussão pelo STF, a respeito da constitucionalidade da Lei de Arbitragem.
Esse caso refere-se à homologação de laudo arbitral estrangeiro prolatado na Espanha. O pedido, anterior à Lei 9.307/96, havia sido inicialmente rejeitado pela ausência de homologação do laudo pelo Judiciário espanhol. Durante o período em que o assunto esteve em pauta, entrou em vigor a Lei da Arbitragem. Imaginou-se que a exigência da homologação havia sido extinta. O Supremo Tribunal Federal, porém, se aproveitou da situação e da necessidade de tratar deste assunto para fazer uma ampla discussão da constitucionalidade do instituto.
No caso em tela, seis Ministros se manifestaram pela constitucionalidade da Lei de Arbitragem: Marco Aurélio de Mello, Nelson Jobim, Ilmar Galvão, Maurício Corrêa, Celso de Mello e a Ministra Ellen Gracie Northfleet. Foram contrários ao posicionamento majoritário, Sepúlveda Pertence e Sydney Sanches. O argumento dos dois últimos foi exatamente “a impossibilidade do Judiciário forçar a parte que desiste da arbitragem a dela participar, pois que se estaria afastando a tutela do Poder Judiciário, o que não seria possível”.
Ressalte-se aqui o voto da Ministra Ellen Gracie, sustentando que "Não vejo renúncia à tutela judicial neles, mas uma mudança no foco e na ocasião em que se dará o apelo ao Judiciário." E em outro tópico de seu voto a ministra afiança: "O cidadão pode invocar o Judiciário para solucionar os conflitos, mas não está proibido de acessar outros meios."
O voto do Ministro Marco Aurélio destaca a importância da Lei, afirmando, quanto à inafastabilidade do Judiciário, que as pessoas não podem ser obrigadas a ingressar em juízo e que a lei consagra a liberdade. Já o Ministro Nelson Jobim abordou a questão na qual uma das partes resiste unilateralmente à arbitragem, ainda que firmado o compromisso, e que o Judiciário se encarrega de suprir a vontade, entendendo não haver incompatibilidade com a Constituição.
Convém ressaltar que o Regimento Interno do STF, em se tratando de declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, dispõe, em seu artigo 173, que se proclamará a inconstitucionalidade ou constitucionalidade do preceito ou atos impugnados, se num ou noutro sentido se tiverem manifestado seis Ministros. Faltariam então três votos, porém, não alterariam o resultado da votação.
Assim, a decisão do Supremo diferencia definitivamente a arbitragem resultado da Lei 9.307/96 daquela aplicada até então pelo Código de Processo Civil, a qual, obrigando a homologação de suas sentenças, lhe retirava toda a autonomia.
Outro aspecto é fundamental que seja lembrado neste momento; o Brasil, em 25 de abril de 2002, formalizou finalmente adesão à Convenção de Nova York, sobre reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras, ratificando-a, conforme se verifica a seguir:
Decreto 4.311 Promulga a Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição,
Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto da Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, por meio do Decreto Legislativo no 52, de 25 de abril de 2002;
Considerando que a Convenção entrou em vigor internacional em 7 de junho de 1959, nos termos de seu artigo 12;
DECRETA:
Art. 1o A Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, apensa por cópia ao presente Decreto, será executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém.
3.1. Homologação da Sentença Arbitral
Durante muitos anos de vigência do Código Civil a arbitragem permaneceu esquecida[8], em razão da necessidade da sentença arbitral ser homologada pelo Poder Judiciário.
Todavia, não é mais necessária a homologação, nas sentenças arbitrais estrangeiras. Estas se tornam válidas mediante a comprovação de que no país de origem, foram obedecidos os requisitos da arbitragem e foram preservados os direitos fundamentais de defesa. Essa sentença arbitral é trazida ao Supremo Tribunal Federal onde será homologada, da mesma forma como se homologam as outras sentenças estrangeiras. Efetuado o exequatur, a sentença arbitral é levada ao Tribunal local encarregado da execução.
Havia uma situação, na qual podia ser negada a homologação pelo Supremo, quando necessário que fosse submetida a este Órgão, e que funcionava da mesma forma que a reprovação das sentenças estatais; isto ocorria se a sentença ofendesse a Ordem Pública ou se dissesse respeito aos direitos indisponíveis no Brasil. Atualmente este procedimento pode ser determinado pelo juiz estatal, quando provocado, se for cogitada a nulidade do procedimento.
4. Natureza Global da Arbitragem
A arbitragem, como anteriormente exposto, é um encaminhamento alternativo para não se submeter à falta de eficácia do Poder Judiciário. Vale a pena ressaltar que, quando se fala de eficácia, se objetiva sigilo e rapidez na solução dos litígios. E quando se considera o contexto internacional, torna-se ainda mais necessária a adoção de soluções ágeis, que permitam atingir os objetivos acima citados.
As partes firmam o compromisso para que, se surgir questão controversa na execução do contrato, o conflito não seja submetido ao Juiz Estatal, mesmo porque, em se tratando de contrato entre empresas de dois diferentes países, a possibilidade de se atingir a imparcialidade pelo Estado que recebe um litígio entre um nacional e um estrangeiro é mais remota, uma vez que dificilmente julgaria a favor do estrangeiro. Assim, não será o membro do Poder Judiciário que decidirá, mas sim um Tribunal Arbitral, ou árbitros escolhidos de comum acordo pelas partes, que atue como órgão internacional. Portanto, existe um cunho, um sentido contratual muito amplo na arbitragem.
Hegel já dizia: “O direito internacional é o resultado das relações entre Estados independentes.” (Princípios da Filosofia do Direito)
A Arbitragem se configurou como instrumento para solução de conflitos muito antes da Justiça Estatal e é instrumento utilizado em todos os países desenvolvidos, especialmente nos Estados Unidos da América, Japão, França e Inglaterra. Nos Estados Unidos, dois terços dos conflitos comerciais são resolvidos por meio da arbitragem. A sociedade assume um mecanismo eficiente e há muito tempo praticado em todo o mundo.
Deve ser considerado que a comunidade internacional utiliza a arbitragem para resolver disputas comerciais que surgem no mercado global. Nesse sentido, já foram estabelecidos tratados, leis internacionais e leis nacionais que dão sustentação ao instituto. A Convenção de Nova Iorque de 1958 foi amplamente adotada por diversos países e, finalmente, também pelo Brasil, proporcionando condições legislativas que permitam sua execução. As cláusulas arbitrais são executáveis. Sentenças arbitrais de comércio internacional são reconhecidas por juízos e tribunais nacionais na maior parte do mundo, até mais que sentenças judiciais estrangeiras.
A Dra. Nadia de Araújo lembra que, “pela Lei da Arbitragem permite-se às partes, em um contrato nacional, que estipulem a aplicabilidade na Convenção Arbitral dos Princípios[9], entendidos como o conjunto de normas que regerá as questões envolvidas na disputa. Desta forma, os Princípios, até então desconhecidos no Brasil, poderão converter-se em uma alternativa muito interessante às leis internas, perfeitamente viável em contratos internacionais e internos. Essa possibilidade de utilização dos Princípios no Brasil servirá para encorajar outros estudos comparados, contribuindo para a criação de um novo ius commune, o que já vem sendo desenvolvido em outros países”[10].
Visando proporcionar padronização aos negócios comerciais, a internacionalização da arbitragem fez com que fossem adotadas regras internacionais, as quais foram desenvolvidas para uniformizar os tribunais e câmaras, assim como prevenir a incerteza de terem de submeter à justiça local a solução de questões de natureza processual.
“No advertimos ningún inconveniente en la intervención en casos de arbitraje internacional[11], en cuanto las partes así se sometieran[12], de un Tribunal Arbitral privado, aunque su Reglamento omitiera referirse a ello. No se advierte afectación a lo previsto por ley 24.322, aprobando la Convención Interamericana sobre Arbitraje Comercial Internacional”[13], afirma Efraín Hugo Richard, árbitro argentino.
Instituições de arbitragem estão sendo criadas em vários países para solucionar casos nacionais e internacionais. Um grande número desses países já celebraram acordos de cooperação com a American Arbitration Association ("AAA")[14], órgão arbitral norte-americano, e um dos mais desenvolvidos nessa matéria.
Já em 1872, há portanto aproximadamente 130 anos, existem registros de arbitragem extraterritorial envolvendo o Brasil. No “caso de Alabama” entre Grã-Bretanha e Estados Unidos, as partes escolheram um colegiado de cinco árbitros para dirimir o conflito, dois dos quais representavam cada uma das partes, e os outros três, que não eram chefes de Estado e sim particulares, o que representou grande inovação, eram absolutamente neutros. Os arbitros foram representantes da Confederação Suiça, do rei da Itália e do Imperador do Brasil, Pedro II, o qual encarregou do ofício o Visconde de Mauá, Marcos Antonio de Araújo[15].
Numa fase mais recente, houve inovação nesse instituto, mantendo independência de indicação “ad hoc” da soberania dos Estados, onde os árbitros passaram a ser escolhidos no quadro da Corte Permanente de Arbitragem, em Haya. Este órgão consiste em uma lista permanente de aproximadamente 200 árbitros, permitidos quatro a cada país integrante.
Objetivamente, se as partes de diferentes países, em um conflito, resolvem mediante compromisso arbitral, equiparado aqui ao tratado bilateral entre particulares, optar por tribunal de um Estado, terceiro e imparcial, nada há que os impeça de escolher o órgão jurisdicional que irá resolver o litígio.
Destaque-se aqui e a propósito, a afirmação de Efraín Hugo Richard, sobre a possibilidade de se determinar uma cláusula compromissória como meio de “heterocomposición del conflicto” que possa derivar deste contrato, cláusula que pode consistir em árbitros que atuem fora do país. E arremata, dizendo: “...de su legalidad nadie duda”[16].
Em países mais desenvolvidos, como Estados Unidos e os da União Européia, esse instituto é um procedimento corriqueiro, por outro lado, as empresas brasileiras sempre deixaram de incluir, nos contratos internacionais, cláusulas estabelecendo compromisso arbitral. Da mesma forma, os estrangeiros evitavam a arbitragem, uma vez que tinham conhecimento da falta de uniformidade legislativa.
Mais uma vez, são aqui utilizados os conhecimentos de Silvio de Salvo Venosa, no sentido de demonstrar o fácil emprego da arbitragem: “Em um contrato com franceses, com ingleses, com norte-americanos, no caso de dúvida, não será nem esse e nem aquele poder Judiciário que decidirá. Quem decidirá é o Tribunal Arbitral de Paris, de Nova York, de São Paulo, de Buenos Aires, de Santiago... não importa, basta que se defina quem decidirá”. Por outro lado, pode não ser definido o Tribunal Arbitral, mas sim determinado que no futuro se designará então, um corpo de julgadores escolhidos pelas próprias partes interessadas, independentemente de se valer já de plano, de um Tribunal Arbitral instituível.
Países, como a Argentina, também se vêm adequando à modernização jurídica global, conforme pode ser constatado pelo que diz o Dr. Richard: “Recientemente se ha suscripto el Protocolo de Buenos Aires sobre jurisdicción internacional en materia contractual, creando la Comisión de Comercio del Mercosur, órgano intergubernamental que puede proponer reglamentaciones y nuevas normas o modificaciones de los existentes en materia comercial. El protocolo se aplica a la jurisdicción contenciosa internacional de los contratos de derecho privado económico celebrados entre personas (físicas o jurídicas) con domicilio o sede social en los diferentes Estados firmantes del Protocolo de Asunción, convirtiéndose en el marco de actuación de la autonomía de la voluntad para la elección del Tribunal competente[17], que puede alcanzar a un Tribunal Arbitral”.
“É justamente com a Lei de Arbitragem, de 96, que o país se moderniza e se insere no contexto internacional de arbitragem, que é muito amplo, pois em discussões contratuais e negociais internacionais, com muita freqüência, nos contratos de grande monta e também nos contratos de média monta, as partes procuram inserir uma cláusula arbitral”[18], afirma o jurista Silvio de Salvo Venosa.
Em síntese, a condição de inconstitucionalidade mantida pela omissão do Supremo Tribunal Federal até pouco tempo atrás, fez com que o país ficasse fora do contexto contratual universal. Felizmente com a recente decisão pacífica sobre sua legalidade, a arbitragem, o juízo arbitral, os Tribunais de Arbitragem, a possibilidade de arbitragem nos contratos, insere-se o país no contexto contratual universal.
O que permite que o Brasil integre esse rol de países que adotam a arbitragem como alternativa para resolver disputas é o fato de ser signatário de algumas convenções internacionais, como a convenção do tratado do Panamá, de Montevidéu, e agora, mais recentemente, também da convenção de Nova Iorque, que é a mais comum e mais utilizada nos Estados Unidos da América.
5. Arbitragem entre os Países do Mercosul
O direito internacional e a integração entre países por blocos econômicos, necessita de recursos jurídicos que instrumentalizem as soluções de controvérsias comerciais, com premissas válidas em tratados bilaterais ou multilaterais. No Mercosul, que vem caminhando no sentido de alcançar uma união aduaneira entre seus membros, existe um incremento constante nas relações e transações comerciais, procurando sempre a adequada segurança jurídica para resolver litígios.
A arbitragem serviu para os países como instrumento, ao longo da história, nas controvérsias internacionais relativas a questões de posse e domínio de territórios; e com o desenvolvimento da humanidade, além de servir aos Estados, passou a atender às necessidades, por ser útil, eficaz e de baixo custo, também para particulares, na busca de soluções em litígios de comércio, internacional ou não, envolvendo empresas, firmas, fornecedores e consumidores de diversos países.
O Brasil está intensificando seu comércio exterior e ampliando suas relações econômicas e financeiras internacionais e, conseqüentemente, vem se deparando com crescentes desafios e dificuldades, de natureza comercial, nas transações que envolvem os quatro países integrantes do Mercosul. Para dirimir tais dificuldades, em geral decorrentes da instabilidade macroeconômica que atinge seu principal parceiro – Argentina – o Brasil e demais membros do Mercosul vêm criando uma verdadeira consolidação que garanta o sucesso desse pacto comercial.
Em virtude dessas dificuldades, os Estados membros do Mercosul se sentem desestimulados em criar instâncias supranacionais, cuja utilidade poderia ser questionada, diante da lentidão na estabilização do bloco, optando pela possibilidade de encontrar, em momentos de crise, alternativas menos formais para as negociações.
Adotam, então, o mesmo caminho já estabelecido por aqueles mais avançados, quando estabeleceram convenções internacionais como o Protocolo de Genebra, em 1923, que mais tarde foi praticamente substituído pela Convenção de Nova Iorque, em 1958, seguindo esta evolução o Protocolo de Brasília, de 17 de dezembro de 1991, que passou a recomendar o processo arbitral para a solução de controvérsias no âmbito do Mercosul.
Efraín Hugo Richard, no seu artigo “El Arbitraje o Mediacion Creativa como Sistema de Solución de Controversias”[19], incentiva o instituto da arbitragem internacional, como medida de facilitação nas eventuais divergências, nos negócios realizados entre os países do Mercosul:
“No despegamos de estas ideas la actuación de los árbitros, incluso en casos de arbitraje comercial internacional[20], cuando así lo hubieran previsto las partes. Se trata nada más ni nada menos que señalar que los árbitros deberán también determinar los medios posibles de ejecutar la sentencia por parte de las partes, como formas facultativas de un cumplimiento forzoso”.
Revendo, de forma cronológica, as mudanças propostas internacionalmente sobre o instituto da arbitragem, e que atingiram de alguma forma, ainda que muito lenta, os países da América do Sul, verifica-se:
1 - o Protocolo de Genebra, de 1923, sobre Cláusulas Arbitrais, que estabelece o caráter vinculante da cláusula compromissória prevista em contratos comerciais internacionais;
2 - a Convenção de Nova Iorque, de 1958, a qual trata do reconhecimento e execução de Laudos Arbitrais Estrangeiros, nos países que a subscreveram, e que foi ratificada pelo Brasil apenas em abril de 2002;
3 - Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, firmada no Panamá em 30 de janeiro de 1975; determina o reconhecimento da cláusula compromissória com caráter obrigatório e vinculante, a desnecessidade de dupla homologação de laudo arbitral, a inversão do ônus da prova e aplicação do Regulamento de Arbitragem da Comissão Interamericana de Arbitragem Comercial, ratificada pelo Brasil em 1996, vigente no Mercosul e adotada por 16 países americanos;
4 - a Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros, firmada em Montevidéu em 1979, em vigor na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.
Essas convenções interamericanas são de grande importância, uma vez que foram adotadas pelos quatro países do Mercosul, para manter o ordenamento jurídico uniforme, e precederam Protocolos específicos firmados posteriormente, no sentido de harmonizar as legislações entre os Estados-Partes e fortalecer o processo de integração.
Ainda acompanhando a ordem cronológica, o Tratado de Assunção, instituiu o Mercosul como bloco econômico formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, em 26 de março de 1991. Posteriormente vários protocolos foram firmados para balizar o relacionamento entre esses quatro países, a saber:
a) - Protocolo de Brasília, também em 1991, protocolo para a Solução de Diferendos entre os Estados-Partes, quanto à interpretação e aplicação das disposições contidas no Tratado de Assunção;
d) Protocolo Adicional ao Tratado de Assunção sobre a Estrutura Institucional do Mercosul, o Protocolo de Ouro Preto[21] adotou uma estrutura institucional de natureza intergovernamental, para ajustar-se à dinâmica do processo de integração, firmado na cidade de Ouro Preto, em dezembro de 1994, que trouxe à luz o Mercosul em sua configuração atual e definiu as características institucionais básicas do bloco: a) órgãos decisórios de caráter intergovernamental; b) sistema consensual de tomada de decisões; c) sistema arbitral de solução de controvérsias. O reconhecimento, no Protocolo de Ouro Preto, da personalidade jurídica de direito internacional do Mercosul, atribuiu ao bloco econômico competência para negociar, em nome próprio, acordos com terceiros países, grupos de países e organismos internacionais.
Outros protocolos também foram firmados pelos Estados-Partes, ainda que não tratem de matéria arbitral, como, o Regulamento da Reunião de Ministros da Justiça. , o Protocolo sobre Medidas Cautelares, Protocolo sobre Responsabilidade Civil Emergente de Acidentes de Trânsito entre os Estados-Partes do Mercosul, Protocolo de Assistência Jurídica Mútua em Assuntos Penais, Incorporação no direito interno dos países do Mercosul dos acordos e protocolos na área jurídica, Incorporação no direito interno brasileiro dos acordos e protocolos na área jurídica, Protocolo sobre mediação e arbitragem privadas e Protocolo de Santa Maria sobre jurisdição internacional em matéria de relações de consumo
Mais de dez anos após, e ainda procurando encontrar as soluções adequadas para o desenvolvimento do bloco, econômica e juridicamente, é firmado em fevereiro de 2002 o Protocolo de Olivos, que regulamenta a nova sistemática para a solução de controvérsias no Mercosul, revogando expressamente o Protocolo de Brasília, e que pretende proporcionar a fundamentação necessária à estabilidade do processo de integração regional.
Ensina-nos Welber Barral que “o Protocolo de Olivos mantém algumas características básicas já adotadas: (a) a resolução das controvérsias será por negociação e arbitragem, inexistindo uma instância judicial supranacional; (b) os particulares continuarão dependendo dos governos nacionais para apresentarem suas demandas; (c) o sistema continua sendo provisório, e deverá ser novamente modificado quando culminar o processo de convergência da tarifa externa comum” [22].
O Protocolo de Olivos traz algumas inovações, até então apenas utilizadas na Jurisdição Estatal. A inovação mais significativa, contida no Capítulo VII, se refere à criação de um Tribunal Permanente de Revisão, composto por cinco árbitros, aos quais caberá recurso – limitado à interpretação normativa – da decisão dos árbitros de primeira instância.
A nova postura adotada acompanha aquela já em funcionamento na Organização Mundial do Comércio (OMC), cujo Órgão de Apelação serve como instância uniformizadora das regras multilaterais. Como na OMC, pode-se prever que no Mercosul também haverá constantes recursos das decisões dos árbitros de primeira instância. Entretanto, “a maior delonga para solucionar o litígio será compensada pela maior segurança na harmonização interpretativa das regras do Mercosul”, afirma Barral.
Da mesma forma que o Brasil e Argentina, também o Uruguai modernizou sua legislação para integra-la no contexto das propostas feitas pelo Mercosul. Destaca o Professor Eduardo Tellechea Bergman[23]:
“El Acuerdo sobre Arbitraje Comercial Internacional del Mercosur, aprobado recientemente en Buenos Aires por Decisión del CMC 03/98 del 23 de julio de 1998, en relación a las solicitudes de auxilio jurisdiccional internacional emanadas de tribunales arbitrales, dispone, artículo 19, numeral 4, que dichos requerimientos sean remitidos por el tribunal arbitral al Juez competente del Estado Parte de la sede del tribunal actuante a fin que dicho magistrado los transmita para su diligenciamiento -por los jueces del Estado Parte requerido – a través de las vías previstas por el Protocolo de Medidas Cautelares. A efectos de acelerar la cooperación jurisdiccional en estos casos, el numeral citado prevé asimismo que los Estados Partes puedan declarar al momento de ratificar el Acuerdo o con posterioridad, que el tribunal arbitral requirente pueda solicitar directamente el auxilio a las autoridades judiciales competentes del país de ejecución de la medida a través de las respectivas Autoridades Centrales.
Cabe recordar que en materia de adopción de medidas cautelares, el Acuerdo de Buenos Aires faculta al tribunal arbitral, a petición de parte, a disponer por sí las cautelas que estime pertinentes, resolviendo en su caso sobre las contracautelas, art. 19.1 del mencionado Acuerdo. Disposición ésta última con directos antecedentes en el art. 26 del Reglamento de Procedimientos de la Comisión Interamericana de Arbitraje Comercial Internacional – CIAC – en vigor desde el 1.11.996, así como a nivel de la normativa de fuente nacional, el artículo 81 de la Ley General de Arbitraje del Perú, de 1995 y el artículo 183.1 de la Ley Federal Suiza de Derecho Internacional Privado de 1987[24].”
Finalizando, deve-se salientar que o Protocolo de Olivos traz outras duas alterações marcantes que afetan o Tribunal “ad hoc”: a primeira tem por finalidade esclarecer questões processuais levantadas nos últimos conflitos e faculta ao Estado demandante a escolha do foro internacional para decidir o litígio; a segunda determina a obrigação, para o Estado perdedor da disputa, de cumprir o laudo arbitral, mesmo que venha a sofrer medidas compensatórias como forma de sanção, conforme expressam os artigos a seguir:
“Artigo 26
Obrigatoriedade dos Laudos
1. Os laudos dos Tribunais Arbitrais Ad Hoc são obrigatórios para os Estados partes na controvérsia a partir de sua notificação e terão, em relação a eles, força de coisa julgada se, transcorrido o prazo previsto no Artigo 17.1 para interpor recurso de revisão, este não tenha sido interposto.
2. Os laudos do Tribunal Permanente de Revisão são inapeláveis, obrigatórios para os Estados partes na controvérsia a partir de sua notificação e terão, com relação a eles, força de coisa julgada.
Artigo 27
Obrigatoriedade do cumprimento dos laudos
1. Os laudos deverão ser cumpridos na forma e com o alcance com que foram emitidos. A adoção de medidas compensatórias nos termos deste Protocolo não exime o Estado parte de sua obrigação de cumprir o laudo”.
As necessidades advindas da prática contratual internacional justificaram a adoção das providências legais pelos Estados-Partes nos processos de integração. Por fim, conclui a Dra. Selma Maria Ferreira Lemes: “Com efeito, nesta mesma linha, as contratações privadas no âmbito do Mercosul demandam norte orientador dos Estados, a fim de que possam utilizar instrumentos alternativos de solução de controvérsias que lhes propiciem a segurança jurídica através de soluções rápidas e especializadas para os conflitos existentes.”
A arbitragem é, sem dúvida, o mecanismo mais inteligente até agora desenvolvido para solucionar as controvérsias e disputas que se interpõem às relações comerciais nacionais e internacionais.
6. Reconhecimento e Execução da Sentença Arbitral
A Lei 9.307/96, assegurou à arbitragem desenvolvimento rápido e resultado prático e eficaz, minimizando a intervenção do Poder Judiciário no processo arbitral; foi suprimida a homologação judicial da decisão proferida pelo árbitro, assim como também foi equiparada a sentença arbitral à decisão do Juízo Estatal. Pode ser verificada esta nova situação, no texto do artigo 31 a saber: “A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.”
Quando se fala em sentença arbitral, é preciso ter em mente a explicação que oferecia o Professor Strenger, dizendo que “como na maioria das doutrinas processuais vigentes, a sentença arbitral não deve pecar por falta ou por excesso, isto é, ser infra petita, ultra petita ou extra petita, ou, como alude Boissésson[25], a sentença arbitral é ato jurisdicional, seja qual for o critério escolhido, tanto do ponto de vista formal do procedimento utilizado, ou material, isto é, existência de uma contestação, finalidade e irrevocabilidade, Como todo julgamento, a sentença traz solução de valor obrigatório para o embate das partes em face dos árbitros, surgindo como conseqüência do contraditório geralmente previsto em lei. Seus efeitos são de julgamento, compreendido como ato pelo qual o juiz diz o direito, pelo poder de jurisdicto e determina, em conseqüência, as medidas necessárias a assegurar a eficácia (imperium)” [26].
Em se tratando de direito comercial internacional, o Brasil antes de 1996 e mesmo até 2002, se colocava à parte das normas utilizadas por outros países, quando necessário executar as sentenças arbitrais estrangeiras. Isto ocorreria por que a lei civil determinava que somente se tornaria executável a decisão arbitral, se homologada pelo poder Judiciário. Assim, para que uma decisão arbitral estrangeira fosse executável no Brasil, exigia-se a homologação do Tribunal Judicial estrangeiro respectivo.
Ocorre porém, que muitos países não adotam procedimentos arbitrais amparados em sua legislação, e dessa forma, não homologam sentenças arbitrais. O Dr. Venosa comenta que “na França, por exemplo, os tribunais se recusavam a homologar as decisões arbitrais porque, por mais de um século, sempre se admitiu a decisão arbitral como definitiva e não havia nem como se homologar uma sentença arbitral. Sem essa homologação, a sentença arbitral que vinha ao Brasil, que deveria ser examinada e homologada pelo Supremo Tribunal Federal, na falta desse requisito, não era homologada”[27].
No entanto, sempre que houver necessidade de medidas coercitivas, que impliquem em atos que não podem ser praticados contratualmente, as partes ou o próprio árbitro devem recorrer ao Poder Judiciário através do processo cautelar, procedimento este que apenas pode ser encaminhado pelo judiciário.
A modernização do sistema jurídico permitindo a solução de controvérsias sobre direitos disponíveis por meio da arbitragem, como foi exposto, possibilita, atualmente, maior facilidade, pois o posicionamento do STF, é de exigibilidade à convenção de arbitragem (art. 7º) e dispensa de homologação do laudo arbitral, equiparando-o às sentenças proferidas pelos órgãos do Poder Judiciário (art. 31).
Devido a sua natureza e à aceitação da categoria, a arbitragem vem sendo empregada em conflitos do setor empresarial, principalmente nas relações contratuais internacionais, mormente com o crescente aumento das relações dentro dos blocos econômicos como o Mercosul.
Até meados de 2002, o posicionamento do judiciário sobre o reconhecimento e à execução de laudos estrangeiros, isto é, aqueles que tenham sido proferidos fora do território nacional, era submetê-los à homologação do Supremo Tribunal Federal (art.35), salvaguardadas as hipóteses de tratados internacionais. Desta forma, para que a sentença arbitral estrangeira tivesse eficácia no Brasil, fazia-se indispensável a sua homologação, de acordo com o disposto nos arts. 483 e 484 do Código de Processo Civil e do Regimento Interno do STF.
O meio, então, utilizado para o reconhecimento e execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras era a Convenção de Nova Iorque, firmada em 10 de julho de 1958, com participação hoje de cerca de 110 países, os quais se comprometiam e se comprometem, mutuamente, a reconhecer e executar os laudos arbitrais estrangeiros, sem que necessariamente sejam sujeitos à homologação.
Com a adesão Brasileira à Convenção de Nova Iorque deixou de ser imprescindível a prévia homologação dos laudos arbitrais estrangeiros, passando estes a terem valor de sentença nacional, podendo ser executadas no território a qualquer tempo. Assim, equiparadas às sentenças cíveis, as sentenças arbitrais, podem ser declaratórias, constitutivas e condenatórias, e de acordo com o Código de Processo Civil (art. 584, VI), o art. 31, in fine, da Lei n.º 9.307/96, considera título executivo judicial, o laudo arbitral condenatório. Por sua vez, os laudos de conteúdo declaratório e constitutivo não necessitam do processo de execução, sendo suficientes para gerar seus efeitos legais. Por conseguinte, o Decreto 4311 de julho de 2002, permite que os laudos estrangeiros, independentemente de prévia homologação pelo Supremo Tribunal Federal, atinjam os mesmos efeitos dos laudos nacionais, ou seja; na hipótese de sentença condenatória, será imediatamente passível de execução e, quando declaratória ou constitutiva, será suficiente para gerar efeitos reconhecidamente legais no Brasil.
Porém, é conveniente ressaltar que a sentença trazida a território nacional não deve ferir a ordem pública, a soberania nacional e os bons costumes, conforme artigo 17, da Lei de Introdução ao Código Civil. Este aspecto relativo à essência do julgado estrangeiro poderá ser apreciado em primeiro momento pelo juízo de primeira instância e, de acordo com a matéria, poderá ser analisado pelo STF.
A sentença estrangeira, seja ela arbitral ou de juízo estatal, não poderá versar de tema sobre o qual a lei brasileira confere competência exclusiva às cortes brasileiras. Aqui pode ser usado um exemplo clássico como o de homologação de sentença relativa a imóvel situado no território nacional, pois a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 12, parágrafo I', estabelece que "só à autoridade judiciária brasileira" compete julgar tais ações.
Como se observa, o Brasil firmou a Convenção de Nova York, ratificou a Convenção do Panamá de 1975, assim como, em âmbito mais restrito, firmou vários tratados, acordos e protocolos de maneira a viabilizar a assistência jurisdicional entre os países integrantes do Mercosul. Da mesma forma a Le
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